14 agosto, 2008

Cavalos negros

Quatro cavalos negros cavalgam cerimoniosamente como se soubessem que levam a morte. Foi o compasso dos cascos no asfalto que me fez abrir a janela para ver passar o cortejo fúnebre, mas a visão da carruagem florida não corresponde ao som – desliza como se fosse puxada por cavalos alados. É uma imagem anacrónica.
Um camião das obras e um autocarro desaceleram enfadados. Nos passeios, as pessoas olham desinteressadas e continuam a caminhar como se todos os dias fosse alguém a enterrar. Nos prédios, só eu venho à janela. Dentros dos mercedes negros como o poder, as pessoas permanecem impávidas.
É uma imagem anacrónica, mas a morte é anacrónica. Coroaram os quatro cavalos negros com plumas negras, mas nem isso lhes retira a gravidade.
Quatro cavalos negros cavalgam como se fosse a primeira ou a última vez que alguém morresse. Cada morte é sempre a primeira e a última.