14 julho, 2008

Wimbledon

A primeira vez que fui a Wimbledon, lembro-me sobretudo dos pormenores até lá chegar. Quando o metro parou na estação de Southfields (sim, não é em Wimbledon que se sai para ir para o torneio de ténis, mas duas paragens antes) não queria acreditar que o chão da estação de metro estava alcatifado – de verde. Começava ali o relvado de Wimbledon.
De um lado da plataforma chegavam pessoas que, depois de um dia de trabalho, tentavam ainda ver um dos últimos jogos antes de escurecer. Do outro lado da plataforma, outras regressavam a casa, provavelmente depois de terem passado todo o dia no torneio. Invariavelmente, as mulheres estavam bem vestidas, com roupas claras de verão, pullovers de riscas, sandálias elegantes, algumas de chapéu. 
Um rapaz indiano, debaixo de um dos vasos com flores que se repetem a cada dez metros a partir daqui, apontava os horários exactos dos comboios que chegavam e partiam e eu não percebi se aquela minúcia tinha alguma coisa a ver com o facto de Wimbledon estar a decorrer ou não; se seria uma espécie de regra antiquada mas persistente, como a mudança dos juízes de linha que, comparou recentemente um cómico inglês, excede o render da guarda do palácio de Buckingham.
Ainda guardo uma recordação da primeira vez que fui a Wimbledon – um guia de “como fazer fila” e um autocolante que diz: “Eu fiz fila em Wimbledon”.
Uma vez lá dentro, a bebida oficial é Pimm's, um clássico do Verão inglês, e a comida oficial morangos com chantilly, tomados com a descontracção de quem bebe cerveja e come batatas fritas de pacote.
Dessa primeira vez, vagueando de corte em corte de entrada livre, estava fascinada por tudo, excepto o jogo de ténis propriamente dito. Distraía-me a observar os rapazes de calções e as raparigas de mini-saia a apanhar as bolas coreografados; e a apreciar a imobilidade e concentração dos juízes de linha, mais uma vez usando a comparação com Buckingham, aposto que se pode fazer caretas mesmo à frente dos juízes de linha que estes não se mexeriam.
Só da segunda vez que fui a Wimbledon comecei a interessar-me pelo jogo. Era Hewitt contra um coreano de quem não me lembro o nome. No corte 1 de Wimbledon percebi a eloquência dos ooohs, aaahs e das palmas de uma audiência de ténis.
Mas foi só à terceira que senti o que é fazer parte do público de ténis, fazer parte de Wimbledon, e até mesmo, de Londres. Não sei bem como é que isto aconteceu, mas na minha terceira vez em Wimbledon - este ano – acabei no Corte Central, e na final.
Passos acertados como soldadinhos, entraram os “caça-bolas”, depois os juízes de linha. E o árbitro sentou-se no seu lugar e deu começo ao jogo entre Roger Federer e Rafael Nadal.
Não foi um jogo mas um duelo. Os rapazes e raparigas com cerimónia passavam as bolas como amunições aos jogadores. E o público assistia como se fosse uma questão de honra, esperando que se fizesse justiça.
Houve momentos em que me senti dessíncrona da multidão, porque claramente a maioria apoiava Federer, mas nunca a multidão deixava de aplaudir quando Nadal fazia um ponto brilhante e derrotava o campeão a que Wimbledon tinha ganho afeição nos últimos cinco anos.
Tapou-se o relvado, abriram-se os guarda-chuvas, fecharam-se os guarda-chuvas, destapou-se o relvado, por duas vezes esperou-se que a chuva passasse. O duelo continuava. Caía o dia. Tínhamos chegado às duas da tarde e continuávamos ali já passava das nove da noite. Caía a luz.
Os últimos pontos foram vividos como se cada um de nós na assistência tivesse também, ali no Corte Central de Wimbledon, alguma coisa em jogo. E quando Federer mandou a última bola à rede, e Rafa se estendeu emocionado no verde de Wimbledon, toda a gente sabia que tinha sido feita justiça. E todos tínhamos ganho alguma coisa.